A DÍVIDA : É OU NÃO PARA SER GERIDA?

            

                Quando José Sócrates afirmou que era uma “criancice” dizer-se que as dívidas eram para ser pagas (dívidas soberanas, claro está ), mas eram, sim, para ser geridas, todo o mundo lhe caiu em cima, quais virgens feridas por tamanho sacrilégio!

 Claro que Sócrates tinha razão. As dívidas dos países têm que ser geridas. Ou antes, os seus pagamentos têm que ser geridos, através da obtenção de nova dívida que substitua a anterior, de modo a não colocar em risco a gestão  e evolução do próprio país. Mas os países, para conseguirem essa renovação, têm que cumprir critérios que dêem noção aos financiadores do seu controle, da capacidade de gerar receitas para pagamento dos juros inerentes e indicadores económicos que sustentem a necessidade de novos financiamentos que acompanhem o seu crescimento e melhorem a vida das suas populações.

                Se neste momento a Banca, nacional e internacional, exigisse o pagamento da dívida da EDP, da PT etc., estaria alguma delas preparada para pagar? NÃO! Se no vencimento de algum empréstimo estruturado, obtido para financiar o seu crescimento, essas mesmas empresas, não tivessem capacidade para proceder ao seu cumprimento, isto é, não tivessem conseguido um sindicato bancário que lhes permitisse refinanciar a dívida vencida, o que sucederia? Incumprimento, bola de neve…falência. Também aqui estas empresas têm forçosamente que apresentar indicadores de gestão e financeiros que permitam avaliar o seu grau de risco, ter um “rating, portanto, mostrando capacidade e evolução positivas.

                Portanto, o “ser gerido” quer dizer que um país ou uma empresa devem apresentar múltiplos indicadores que demonstrem a sua capacidade para honrar a dívida, através de refinanciamentos e capacidade de gerar meios que sustentem os seus projectos. Mostrar, portanto, capacidade de reembolso.

                Porque qualquer empresa ou país só estará preparado para pagar/ amortizar dívida líquida quando o crescimento da sua economia o proporcionar, através de “superavits”, isto é, não ter “deficit”, ter receitas superiores às despesas e ter os seus investimentos resguardados por esses “superavits”.  Mas, mesmo assim, até há países com enormes “superavits”, como a Alemanha, que não amortizam dívida líquida! Compram dívida barata e vendem-na cara! Outra maneira de gerir as dívidas!…

                O que aconteceu com a evolução da dívida Portuguesa é por demais conhecido e sabia-se que os anos de 2010 e 2011 eram crucias para a sua gestão, porque se venciam importantes “stocks” e era necessário antecipar o recurso aos Mercados para conseguir a sua substituição para maturidades mais longas. Basta relembrar os jornais da época e o problema colocava-se também a outros países como Itália, Japão etc. e, dada a gravíssima crise financeira cuja erupção tinha abalado e continuava a abalar todo o sistema financeiro internacional, as taxas de juro nos mercados subiram exponencialmente e o Sistema viu-se incapacitado para reagir, nuns casos por receio e noutros por impossibilidade, isto é, quem ainda tinha liquidez retraiu-se, provocando escassez de oferta e a concomitante subida dos juros. Na altura José Sócrates correu meio mundo procurando a solução, mas tal não sucedeu, como toda a gente sabe e daí o inevitável resgate : financiamentos do Banco Mundial, do Banco Central Europeu e Comunidade Europeia para honrar as tais maturidades que se venciam e para outras necessidades emergentes, como a Banca, por exemplo.

                Daí o “ajustamento” interno feito inevitável por estes novos credores, a TROIKA, que, por incapacidade da Banca, arrastada na torrente da bolha imobiliária, em continuar a financiar a economia, tornou inevitável o crescimento desmesurado de falências e do desemprego.

                A queda do PIB e a Recessão foram consequências e a necessidade de cumprimento dos défices orçamentais ( por si sós geradores de dívida e de mais dívida quanto mais aumentam) estabelecidos pela Troika, de difícil execução dada a diminuição das receitas e a rigidez da despesa ( maioritariamente constituída por salários, prestações sociais e juros), teve como consequência o empobrecimento geral e a degradação dos serviços e apoios sociais.

                Mas, pagou-se dívida? NÂO!

                O aumento da taxa de endividamento em função do PIB, muito apresentado e comentado, não me incomoda muito porque é evidente que, mesmo mantendo inalterável o “stock” de dívida, se o PIB descer essa taxa aumenta, inevitavelmente. O que me incomoda é o “stock” líquido. Diminuiu? NÃO! Aumentou! Porquê? Porque aumentou o valor dos juros e tivemos que financiar os défices. E como a economia regrediu e o défice pouco baixou, “torrou-se” dinheiro! O dinheiro da pobreza!

                Afinal e finalmente, o que é ir aos Mercados? É aquilo que o nosso Tesouro tem vindo a fazer, com algum sucesso e aproveitando a descida das taxas de juro nos mercados secundários, através da oferta de dívida, ainda a taxas bastante altas em comparação com as da Espanha e Irlanda, a novos agentes financeiros dispostos a comprá-la, para honrarmos dívida vincenda e “chutar” a mesma mais para a frente. Pagamos dívida? Pagamos. Mas reduzimos dívida líquida? NÃO! Gerimos a dívida, portanto!

                O “ajustamento” é compreensível face à diminuição das receitas e à rigidez da despesa. Se não temos capacidade para gastar tanto quanto gastávamos, que remédio se não emagrecer. É igual nas famílias. O problema é a equidade nos sacrifícios impostos. É a dose. É a injustiça. É fazer sempre o mais fácil. São as “capelas” e as classes. Os intocáveis e os donos do sistema. Aqueles que nunca são atingidos. Sempre foi assim e é por isso que sempre houve Revoluções ao longo da História. Mas volta-se sempre ao mesmo…

                É claro que Sócrates tinha razão…

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