São referendos, como este na Escócia, a que se seguirá em Novembro o da Catalunha e a que seguirão outros, no País Basco, na Córsega, na Sardenha etc….que vão adiando o inevitável, porque nos induzem a pensar que a fragmentação está mais adiantada que a “ federação”. Mas, para já, todos suspiram de alívio, conscientes que tudo isso abalará os seus poderes instituídos e certos de que não prepararam nem estão preparados para tal mudança…
E porque vão adiando o inevitável? Por razões várias, mas a principal delas é que se tratando de regiões com autonomia económica, com fronteiras estabelecidas e ancestrais, com língua e bandeira próprias, com culturas identitárias e sendo maioritariamente nacionalistas, sofrem impulsos patrióticos que ultrapassam e sublevam qualquer ideologia e os levam a esquecer qualquer sentido de solidariedade pátria.
Mas no entanto só o conseguirão quando grande parte da população que não pertence às elites pensantes, embora subscreva o essencial, conseguir ultrapassar medos e dúvidas que têm a ver com a vida corrente e o risco dela poder ser baralhada pela perda do vínculo umbilical à Pátria existente. Isto passou-se mesmo agora na Escócia. Por isso ganhou o NÃO. Decidiram, como eles dizem, os silenciosos…
Mas não é isto que eu quero relevar neste texto, embora o exposto seja o “ leitmotif”, mas sim evidenciar o que estes surtos independentistas representam e consubstanciam em termos políticos e sociais. E revelam, no meu entender, algo de socialmente malévolo e retrógrado e de moralidade inaceitável naquilo que eu entendo como a sociedade deve estar estruturada : num País, num Território, as regiões mais ricas devem contribuir subsidiária e solidariamente para a estabilidade das mais carentes, num exercício de complementaridade e integração.
Mas o que se verifica é que as regiões mais ricas sentindo-se com meios suficientes para caminhar por seu próprio pé, ou porque detêm riquezas naturais, ou concentram em si as indústrias empregadoras, ou porque concentram no seu espaço os órgãos do Poder, tanto político como financeiro, os Serviços e suas sedes…querem abdicar dessa obrigação : a de apoiar economicamente as restantes regiões que compõem o seu País ou Federação.
As Regiões com mais potencialidades não querem ser solidárias com as mais dependentes. Essa é que é a realidade! E tal como os países do Norte em relação aos do Sul, eles são trabalhadores e criadores de riqueza e os outros, os do Sul, são preguiçosos e estouvados! E vivem acima das suas possibilidades…
Mas eu diria, digo, de maneira diferente: eles têm onde trabalhar, os outros não…emigram. E, poupando, mandam remessas para os Bancos que eles dirigem e aonde trabalham, e que estão sediados nas suas zonas, onde têm os Serviços, os Bancos, as Seguradoras, as Fábricas e tudo o resto…feito com a utilização das suas remessas, do seu dinheiro. E da sua mão de obra barata, que eles necessitam, para as fábricas, para as suas usinas e para as suas obras…
É o que é! Os tais pobres, das regiões mais pobres, dão-lhes o dinheiro das poupanças e das remessas, dão-lhes o pão o trigo e o milho, vendem-lhes a carne que não comem e o peixe que nem vêm…tudo a preços de envergonhar a esses intermediários donos dos centros do consumo e os legumes e as frutas que eles consomem enquanto discutem os seus negócios e fazem máquinas e automóveis, coisas de valor acrescentado sendo, por isso…mais produtivos e, por tal, ganhando mais, muito mais…
Mas enquanto eles produzem essas coisas gama alta e de grande valor acrescentado ( e por isso são mais produtivos, repito), os outros têm montes para onde levam as cabras, que dão o leite de onde fazem os queijos que eles tanto apreciam. E degustam em sessões luminosas… E têm os espaços para onde eles vão caçar, para onde se vão divertir e contar vantagens…e têm aqueles recantos paradisíacos para onde também vão quando estão cansados, coitados e onde construíram espaços arquitectónicos onde ganham alento fruindo a natureza, selvagem e pura…
Noutros lugares eles colhem as azeitonas donde extraem o azeite que tanto apreciam, extraem as trufas que os deliciam, aqueles cogumelos com que fantasiam, o vísaro que eles elogiam e que comem com os seus confrades em ceias de eleição, tal como a lampreia que lhes enche a alma e que acompanham com esse néctar dos deuses, essa coisa indizível que se chama vinho, que os enlouquece, que os acompanha e que os adormece… Tudo colhido e produzido pelas mãos desses pobres, que nasceram e trabalham nas regiões pobres, que lhes dão tudo mas que eles, solidariamente, não querem ajudar.
Mas é aí que eles vão descansar, nesses lugares que eles apelidam de maravilhosos, mas…pobres. Onde há muita coisa abandonada e negligente porque…há pouca gente! Onde até há casas, mas estão…desabitadas! Onde há paisagens únicas que são…miragens! AH! Mas eles fizeram auto-estradas para lá chegar e encurtar as viagens, para aquelas paragens, onde mais tarde, suficientemente reformados, vão estacionar e repousar…
E eles que sempre estiveram longe, no bulício dos Serviços, dos Bancos e dos Ministérios, nos circuitos do Poder e longe de pensar que era sua obrigação ajudar, querem ser independentes para continuar a mandar, que é o que eles sabem fazer. E os outros, os outros dão-lhes aquilo que eles apreciam e compõem os prazeres da vida, aquilo de que tanto gostam, de que precisam para desfrutar e depois…depois até escolhem esses lugares para morrer…
Acabo como sempre: grandessíssimos filhos da outra….realidade!