Tendo em consideração aquilo que a seguir verão escrito este título deveria ser um sub-título, porque em importância inferior ao que do texto pretendo relevar. Mas mantenho o título e, precisamente por causa disso, aconselho a que o leiam e porquê verão! Poderão discordar e acusarem-me de estar a ser demasiado rigoroso na apreciação mas é o que, no momento, sinto.
Vou falar neste texto de duas pessoas, ambas elas influentes e com coluna e voz próprias na vida portuguesa, que são o Miguel Sousa Tavares e o José Pacheco Pereira. Mas dirijo-me em particular ao primeiro.
Ambos têm origens semelhantes, mas apesar de ambos serem oriundos da burguesia Portuense, têm ambos opiniões diversas, escrevem coisas diferentes, têm pressupostos divergentes mas ambos escrevem. Um escreve e o outro pensa e escreve. Um feito de observações várias, de conceitos dos quais não se consegue desligar ou abstrair, Miguel Sousa Tavares e outro, José Pacheco Pereira, feito de pensamento evolutivo, sedimentado em estudo rigoroso e, sendo ou não polémico, apresenta fundamentação.
Ambos sempre segui e continuo a acompanhar, concordando e discordando, mas elegendo-os, um pela sua polémica frontalidade e outro pela sua sapiência de estudo e trabalho criada, como pessoas que merecem a minha atenção.
Mas um dispara e o outro tentando compreender estuda. Um contesta e o outro medita. Um disserta e o outro elabora. E tudo isto faz para mim uma grande diferença e, vindo ambos de uma burguesia Portuense esclarecida que nos habituamos a respeitar, um evoluiu, vai ao fundo das coisas, não perde o tino, e o outro apenas dispara. E dispara em todas as direcções, como se não houvesse um alvo fixo e esse alvo constantemente se movesse.
E, assim sendo, nunca tem opinião sedimentada. É um diletante, dispara conforme os ventos, mas há um “vento“ que ele nunca esquece e que elege quase como um “fetiche”: o partido comunista! Eu escrevo-o em minúsculas para não o diminuir, mas chega a ser aviltante o desprezo que a mim e que a outros como eu dedica e que há anos e anos o lemos. Chega a ser quase um exercício de masoquismo lê-lo quando do Partido Comunista fala, agora com maiúsculas. Como se não houvesse votantes no Partido Comunista, na CDU, e esses votantes, 8, 9 ou 10%, fossem uma cambada de irresponsáveis, que não sabem o que fazem nem o que querem, um bando de loucos que não sabem o que dizem e não o compreendem. Porque razões? Talvez eu lhe possa explicar meu caro Miguel de Sousa Tavares, também Breyner e Anderssen,
E vou-lhe explicar aquilo que Pacheco Pereira já há muito percebeu e percebeu pelo estudo, pela experiência e pelo saber : é que o PC tem uma história, uma história de luta no terreno pela democracia e pela defesa dos mais fracos, que sempre teve os seus aliados mas que se transformou após a implosão da União Soviética. E por isso há um PC antes da queda do muro de Berlin e outro pós a queda do muro de Berlin. Um PC que ia inevitavelmente acabar, todos diziam e muitos desejavam, porque tinha acabado o seu mentor e guia, a União Soviética, mas que não acabou! Porquê? Isso ele nunca percebeu e, provavelmente, nunca perceberá. E nunca percebeu porque o MST, que se dedica a falar dos dias e diz que estuda a História, nunca se dedicou a estudá-la como Pacheco Pereira faz, nem nunca se preocupou em saber as razões pelas quais tanta gente nele continuou e continua a confiar e votar. E fica parado, parado no tempo, com todos os fantasmas que o atormentam, como se a subsistência do PC fosse algo inimaginável, fruto de anacronismos que as pessoas que o seguem teimam em manter vivos e não fruto de algo concreto, de realidades vivas, da dureza da vida, da vida concreta. Algo como a sua actualização aos ditames dos tempos, o seu, para si, improvável rejuvenescimento e a sua concentração naquilo que ele e muitos desprezam: a luta e a resistência às desigualdades, ao alheamento e à proscrição.
Isso ele não percebe, porque nunca o viveu nem estudou, e vive de conceitos antigos e ultrapassados encrustados na sua cabeça de menino burguês que nunca andou nem sequer passeou pelas lutas, ao contrário de Pacheco Pereira, que andou e estuda, ele nunca ousou actualizar. E Pacheco Pereira diz o óbvio: eles perceberam, quando o muro caiu, que o caminho não era o alinhamento mas sim a autonomia, mantendo o seu ADN doutrinário e uma postura solidária com os ostracizados, com os diminuídos dos seus direitos, dos empregados sem suporte desses direitos, dos desempregados sem ajudas, dos pensionistas alheados e dos funcionários sem futuro. Mas MST nunca isto percebeu.
E por isso, sempre que fala ou escreve acerca dos Comunistas, escreve diatribes sem fim, com ódio mesmo às vezes, mas nunca com saber ou condescendência. Que não procura.
E a verdade é que ao ler o seu artigo no Expresso desta semana e lembrando os seus passados escritos contra Cavaco a quem, em determinado tempo, apelidou mesmo de “ palhaço”, dei por mim a pensar: Mais um! Mais um resistente à mudança, mais um, não sei se movido por medos, se por interesses ou se por simples reacção. Diz compreender Cavaco e acha imprópria a putativa Coligação de Esquerda. Porquê não diz, mas daí resulta a natural conclusão: a coligação da direita, essa sim, é que é natural e de natureza obrigatória. E exclusiva porque divina, como se da natureza fosse. Como se fosse decorrente dos hábitos, dos hábitos históricos. Como que imutáveis fossem e os tempos nunca mudassem a própria História. Reaccionário, digo eu, como é reaccionário qualquer indivíduo que não veja mudanças e a elas não esteja aberto, que não descortina nunca algo de novo e que esteja antecipadamente e sempre contra esse algo novo. É isto um reaccionário. O que, neste caso, MST é.
Ao contrário de Pacheco Pereira, que estudando sabe, afirma que o PC, perfeitamente integrado no regime democrático, quando algo acorda cumpre! Quando afirma firma! Quando a palavra dá ela faz lei! Ao contrário de outros, de todos os outros. Isto faz toda a diferença. É a sobrevivência pela seriedade e nunca pelo interesse. E MST tinha obrigação disto saber.
Mas o MST não percebe e continua pensando como antes da queda do muro de Berlin e, como ele, aí o PC se quedou, continuando dependente dos ditames da política soviética e dos seus interesses, ele ainda pensa. Era até verdade, mas já não é e já não o é há muito tempo. Actualizou-se, soube rejuvenescer, reformou-se como devia ser, tornou-se uma entidade independente, comprometida com os seus ideais históricos mas atenta aos tempos e actuando dentro do sistema democrático, actuando, elegendo deputados e governando Câmaras Municipais e algumas mesmo grandes e importantes. E tendo palavra activa.
E digo-lhe agora e em definitivo uma coisa, uma coisa que o MST não sabe e não sabe porque só sabe quem vive com os outros, quem com eles debate, com quem eles conversa, com quem vai ao Café e fala, quem não tem problemas em discutir e conversar, ao contrário de outros como o MST que ficam nos seus gabinetes ou escritórios remoendo os seus preconceitos e as suas verdades absolutas sem se aperceberem que lá fora o mundo muda. Ele não o pressente porque só deve conversar com a Teresa Caeiro e pensa que a ouvindo, ela que até pelo Parlamento anda, já sabe tudo.
E não sabe também mais uma coisa simples, que para si até deveria ser intuitiva: é que todos os votantes na CDU, eu digo TODOS, estão abertos a um programa mínimo de entendimento que assegure uma governação com o PS e BE, na base de três ou quatro pressupostos fundamentais que os unem, seja com apoio parlamentar ou mesmo com representação no governo, dá o mesmo. Assim simples! Não acredita? Pois não acredite, azar o seu. Por isso digo que fala sem saber, sem conhecer e sem, ao menos, estudar e procurar entender. E, por isso, não acha natural nem aconselhável que as esquerdas entrem numa solução de governo.
Como Pacheco Pereira disse, na última Quadratura do Círculo, com todo o pragmatismo: o PC não faz finca pé e aceita um programa mínimo que corrobora e deixa para outras núpcias as questões hoje condicionantes e que, nas actuais circunstâncias, não são de relevância essencial. Aquilo que tanto preocupa MST. E isto, este pragmatismo, está na história do PC, como bem Pacheco Pereira, o maior estudioso da história do PC, bem diz.
MST foi, desde há muitos anos, e eu sempre o segui e por isso o declaro, um feroz opositor da política do faz de conta, do servilismo, da hipocrisia e da menorização do Povo e, nesse contexto, eu sempre subscrevi as suas críticas. Mas no que ao PC, e mesmo ao BE, diz respeito eu nunca o acompanhei, mas fui tolerando.
Mas agora, perante o seu texto, que é uma tomada de posição, perante a sua compreensão pelas palavras de Cavaco e pela aceitação das suas posições contra a Esquerda, deixei de ser tolerante e só me resta reagir, denunciar e concluir: Ele, MST, demonstra ser, afinal, um opositor às soluções de governo à esquerda aceitando, implicitamente, que sejam colocadas num “gueto”. Alinhando com Cavaco e com todos aqueles neoliberais que por essa Europa pululam e com os seus conceitos de democracia: podem votar em quem quiserem mas estão proibidos de entrar em governos…
Quem assim pensa e escreve deixa de merecer o meu respeito, mostra verdadeiramente que não evoluiu e mantem vivo o espírito de defesa da sua classe : a classe dos privilegiados!
Um “Franco Atirador”, eu titulei, para não dizer “pistoleiro”. Não me arrependo pois ele assim demonstra ser, de facto!