Eu li e vi nas redes sociais muitos amigos e conhecidos meus, uns a insurgirem-se e outros a mandarem piadas, acerca da Multa que a ERC (Entidade Reguladora da Comunicação Social) resolveu, certamente depois de muita ponderação e evidentes trocas de complexos argumentos entre os seus membros, aplicar à TVI por esta ter publicado em rodapé, enquanto transmitia um daqueles programas de desporto, que diariamente e a todas as horas transmite, uma notícia, a propósito do caso Banif então em alta, em que dizia que os depositantes acima dos cem mil aéreos iam ficar a vê-los passar e que, segundo especialistas, isso pressupunha uma corrida aos depósitos…
E embora o rodapé tenha sido colocado à noite, suponho eu que não vi, mas esses programas são sempre à noite, diziam os especialistas que a notícia tinha tudo para ser mortífera, disseram depois prever que teria saído do Santander (estão a ver?) mas, apareceu agora a explicação, ela foi sendo actualizada, assim como uma comida que vai sendo preparada, a princípio crua não vale nada, depois de condimentada já ganha outra cara e, quando chega aos finalmente, aí sim, aí já se come… e, afinal, o Estado já assumia todos os depósitos! Mas parece, soube-se depois como sempre, que a transumância dos depósitos foi afinal para a Caixa, o refúgio ainda da incerteza, e não para o Santander. Bem-feita…
Esta é a base da notícia, agora justa e exemplarmente multada, mas eu como a grande maioria das pessoas que não tem, nunca teve, nem sonha ter uma quantia dessas, não liguei nenhuma à notícia mas, há que dizê-lo, parece que haveria para aí uma duzentas e sessenta e sete pessoas (só?), foi o que retive, que tinham lá para isso e muito mais que isso. Mas, para mim, isso pode ter uma explicação: quem tem à volta de um milhão pode facilmente dividir por outros Bancos da praça, mas quem tem mais e muito mais já é mais difícil e, por isso, recolhem-se nos Offshores. Daí que… Mas não deixava nunca de ser um drama, não é verdade!
O Director de Informação da TVI esteve horas e horas no Parlamento, com a TVI 24 a transmitir em directo e a dizer sempre o mesmo, o que eu atrás já disse: que foi a notícia que recebeu e que, depois, foi evoluindo. A notícia foi evoluindo, percebem? Um gajo é dado como morto, afinal depois só teve um violento ataque cardíaco e está no hospital, depois foi uma simples taquicardia e, afinal, foi só um susto e está são como um pêro! Mas, no fundo, eu já sabia que aquilo não ia levar a nada…
A nada? Enganei-me redondamente: levou à Multa! A ERC multou a TVI em 459 Aéreos! Mas, se querem que vos diga, eu achei mal, muito mal mesmo, achei uma exorbitância e, mais do que isso, um valor sem qualquer sentido. Para ser totalmente correcto, incisivo e emblemático, ela teria que ter o valor do Ordenado Mínimo! Assim foi só uma aproximação sem sentido. Teria que ser aí uns 520 Aéreos, não era? E aí sim, aí é que estava bem. E estava bem porque era um sinal, um claro sinal, o sinal de uma multa com referência, uma multa a que muita e muita gente não ficaria indiferente…a do Ordenado Mínimo! Aquilo que a grande parte da população trabalhadora recebe e que tem que lhe dar para um mês inteiro! Estão a ver o significado? Estão porventura a ver o alcance? Agora 459 aéreos… que significa isso? Achei mal…
Mas é uma Multa pesada, muito pesada mesmo e não deixará de ficar nos anais como uma Multa precursora e dissuasiva e que, por isso, deve ser levada em conta!
Senão vejamos: um gajo vai de carro, vai sem cinto e é apanhado. Quanto paga? Cento e vinte aéreos! É uma fortuna, mas o que é comparado com 459? É um quarto, para aí! Um gajo vai de carro e vai ao telemóvel, é apanhado e quanto paga? Cento e vinte aéreos! O que é isso comparado? Nada! É que um gajo, indo ao telemóvel enquanto conduz, pode muito bem ir contra um poste de electricidade! E quem avalia o prejuízo? O que é uma multa de cento e vinte aéreos perante o dramático prejuízo que um gajo poderia causar? Como o deixar para aí umas duzentas e sessenta e sete famílias sem luz em casa? E sem telefone? E sem internet? E sem… E poderia muito bem ir contra uma casa, entrar mesmo por lá adentro, espatifar tudo, matar uma ou mais pessoas, inclusive crianças e, perante isto, o que são cento e vinte aéreos? E o que é isso comparado com quatrocentos e cinquenta e nove, por extenso para sentirem o número que é?
É preciso pensar bem nestas coisas, avaliar bem as suas devidas proporções e não alinharmos num achincalhamento fútil de uma Instituição por demais prestigiada, a ERC, e que teve a ousadia de aplicar a pena que aplicou, uma pena jamais aplicada: 459 Aéreos!
Vocês lembram-se por acaso do caso do Jesus, o terráqueo para que não haja dúvidas, o que na época dos factos era Benfiquista, agora é do Sporting e manhã parece que poderá ser do Porto, esse mesmo, lembram-se? Lembram-se quando há dois anos ou o camando ele, naquele célebre jogo de Guimarães, investiu sobre um Polícia, tirou-lhe mesmo o bastão e já nem sei se até a arma, investiu sobre um Polícia no cumprimento do seu múnus, quer dizer dever, e lhe ter dado umas sapatadas mesmo para que ele largasse o adepto, o tivesse arrastado mesmo, a ele mais ao Polícia, naquela fúria descontrolada a que todos assistimos, lembram-se? Preso não foi, claro, mas sabem que multa apanhou? Setenta e três Aéreos ou coisa que o valha, mas… muito longe dos tais 459 Aéreos aplicada pela ERC!
Como diz um amigo meu: brincamos ou quê? Amigos, deixai-vos de piadas indecorosas e sem fundamento. Tende paciência, a Multa só não é perfeita porque, mesmo aproximando-se, não chega ao Ordenado Mínimo! E é uma pena. O Ordenado Mínimo é que era! É que ele é que é a tabela, o valor orientador de tudo, a base dos subsídios e das pensões dos garanhões, de todas as contas, dos contratos e, quiçá, das multas…
Mas, apesar de tudo, uma Multa de 459 Aéreos não deixa de ser um bom sinal, um sinal de que a impunidade acabou, de que a ERC é capaz de a aplicar e, façamos votos, que a próxima chegue mesmo ao Ordenado Mínimo! Aí é que era…
À Esquerda do Zero 