Confesso a minha admiração quando vi ser esta a cor utilizada nestas manifestações dos Colégios Privados. O laranja até seria mais previsível, mas não. Foi mesmo o Amarelo que escolheram. Assim como que imitando o Brasil? Até pode ser, embora o Brasil tenha o amarelo na sua bandeira, está indelevelmente associado ao seu Escrete- a Canarinha e há no Brasil o antigo hábito da “galera” se vestir de amarelo quando assiste a jogos das suas selecções.
A não ser que…a não ser que, como as classes dominantes brasileiras, maioritariamente brancas, vieram todas de amarelo para as ruas pedir a demissão da Dilma, apropriando-se da cor da bandeira como se apropriaram do país, assim também como quem deseja a manutenção de direitos especiais pagos por todos, também aqui vestiram de amarelo. Pode ser…
Ou então os tais paizinhos terão ficado “amarelos” quando souberam que este governo iria pôr alguma ordem nessa tal “liberdade de escolha”, que é como quem diz, nesses tais direitos especiais de alguns, mas pagos por todos. Outra possibilidade…
Ou como ficaram a saber que para manterem os filhos nessas tais escolas privadas onde andavam, mas onde todos pagávamos, irão mesmo ter que pagar…mais “amarelos” ficaram ainda e passaram essa febre para os filhos, que “amarelos” também ficaram. E quando descobriram que afinal havia uma ou mais escolas públicas ali ao lado, coisa que de todo desconheceriam, mais “amarelos” ainda ficaram, eles mais os cartazes que passaram a empunhar.
Mas, depois do faz de conta, como estavam “amarelos” de saber que elas existiam, ainda mais de amarelo corados ficaram e o amarelo espalhou-se-lhes pelo corpo todo. E cegos por tanto amarelo disseram aos filhinhos que eles, coitadinhos, iam ficar sem escola e que teriam que protestar. Mas que teriam que protestar de amarelo. Mas estes, quando ouviram dizer que, às tantas, teriam mesmo que ir para outra escola, que afinal existe, também eles ficaram pintados de amarelo. E quando vêm a escola para onde terão que ir, mais amarelos ficam ainda, coitados, pois os pais lhes disseram que ela existe, é aquela ali ao lado, mas é má e os coitados até as cuecas e as meias viram ficar amarelas…
Amarelados de assustados, amarelados de desorientados, amarelados de utilizados, amarelados de desconfiados, amarelados de tanto amarelo que já vomitam amarelo. Mas dizem-lhes que o amarelo tem que ir a Lisboa manchar aquele vermelho todo de amarelo e eles, já tocados por tanto amarelo, trocando mensagens lá elegem outro plano: levar o amarelo para os “shoppings” e desatar a fazer compras…Bendito amarelo!
Mas tanto amarelo tolheu-lhes as meninges, toldou-lhes os neurónios e desorientou-lhes os alqueires, como dizia uma amiga, e porquê? Porque ninguém os avisou para o perigo de tanta “amarelagem”…
É que, para além daquelas frases loucas e destrambelhadas, como:
– “Vão ficar onze mil “amarelos” sem escola…”. Vão mesmo?
– “O desemprego de professores vai ser coisa nunca vista…”. Vai mesmo?
– “Os pais vão ficar menos livres e até mesmo sem liberdade…”. Vão mesmo?
– “Há colégios impedidos de abrir novas turmas…”. Há mesmo?
– “As crianças estão desesperadas por terem de mudar de escola”. Disse o deputado do CDS João Almeida, com o coração despedaçado. Estão mesmo? Coitadas…
Para além destas frases de douta sabedoria, não viessem elas dos privados, temos ainda os cartazes. Ai os cartazes, eles sim, a sublimação do “amarelamento”…Vejamos, pois:
– “Deixem o meu filho estudar na escola que eu escolhi para ele”. Que fofura…
– “A escola do meu filho sou eu quem escolho…”. Que determinação…
– “Não à desigualdade”. E “Temos direito à felicidade”. Que esquerdismo… E esta:
– “EM NOME DO MEU, FILHO”. Traduzindo: Em nome do meu virgula filho…Do teu quê, filha?
Nem sei que dizer, isto é, saber eu sabia mas já alguém ironizou com esta letal vírgula. Por isso deixo à vossa deliciosa imaginação…
Vestiram de amarelo e foi pena. Vejam no que deu! A culpa é toda do amarelo, pois toda a gente já tinha obrigação de saber o que é o amarelo. O amarelo será sempre a cor “apesar” do amarelo. Que seria do azul se não fosse o amarelo? Nada, seria azul. Apenas azul. Que seria da Maria se não fosse a Alice? Maria, simplesmente Maria! O amarelo não é que seja errado, mas é alternativo. Não é unânime pois, não sendo rejeitado, é apenas tolerado. Provoca anticorpos quando em doses excessivas. É apenas alternativo.
Carro amarelo? Só alguns. Vestir um fato amarelo? Só um louco ou armado em artista de circo. Porque será que se vêm tão poucos carros amarelos e só assim num Lamborghini ou num Ferrari ele seja tolerado? É que são classe alta, são de gente a quem a excentricidade é tolerada. Que mulheres vestem de amarelo? Quase ninguém a não ser a Rainha de Inglaterra! Mas nela o amarelo é igual ao azul celeste, este igual ao rosa clarinho, este igual ao verde alface e este igual ao roxinho. Nela tudo se pode, porque tudo vai almofadado num grande “bouquet” alojado no peito esquerdo e tudo isso abrigado num enorme chapéu todo aflorado à mesma cor, que completa o ramalhete real. Eles são eles e exercem a sua diferente maneira de gostar e usar. E o seu amarelo, não sendo um amarelo qualquer, ele é devidamente confirmado pela chancela Chanel!
Nada de confusões, portanto, pois em tudo o resto e pelo que constatamos, o amarelo tolda os sentidos.
Portanto, estas mães e estes pais que se vestem de amarelo, que vestem os filhos de amarelo e que vêm para os passeios e praças dizerem que lhes vão tirar a “sua” escola e exigirem a manutenção dos seus filhinhos nas “suas” escolas de sempre, pois que vistam de amarelo. Não me incomodam…
O que me incomoda é que lhes ponham vendas nos olhos para que não vejam as Escolas Públicas ali ao lado, onde andam todos os outros meninos e meninas, seus vizinhos até, e tampões nos ouvidos para que não ouçam os outros meninos e meninas dizerem que andam naquela Escola Pública e que é muito “fixe” …
Mas eu sei, todos sabemos do que se passa e também sabemos da muita “merda” que por aí se passa. Da vontade de isolamento social (a tal escola para pobres e de cor e a escola para ricos e também de cor mas se forem ricos), do desejo de blindagem dos seus filhos em caixas, em redomas onde não possam ser contagiados, das marcas que têm que usar para que não sejam gozados, das sapatilhas xpto e da ganga importada, dessas “merdas” sociais, das Cinderelas e Barbies que têm que ser, dos betinhos Kents idem, dos penteados que levam às discotecas onde com doze anos os paizinhos os/as deixam ir como se dezoito tivessem, dessa “merda” de valores que lhes inculcam, nessas caixas, nessas redomas de “merda” onde vivem…eu sei, todos sabemos da “merda” exclusiva em que se transformam depois nas Universidades privadas, muitos no estrangeiro, onde vão aprender as teorias neo liberais, do vencer a qualquer preço, pisar quem aparecer no caminho, da livre mas exclusiva escolha, do privilégio para eles e o pagamento para os outros…da “merda” em que se transformam estes seres assépticos mas orientados, que não fumam mas aspiram cocaína, que para eles sempre existe e não é crime, gente de bem, mas gente de “merda”…
Como a “merda” dos cartazes que seus pais agora empunham, eles querem a exclusividade dessa “merda” toda, mas querem-na de graça, ou antes, querem que sejamos nós todos a pagá-la. Eles conseguem a “liberdade” de colocar lá os seus filhinhos, através do amiguismo, do facilitismo de alguém, do cavalheirismo de alguém importante, de um lateral conhecimento, de um familiar influente, de alguém do partido, eles conseguem sempre lá colocar os seus filhinhos, onde dizem que se aprende melhor, se estuda melhor e se têm melhores notas. Dizem também os jornais…
Eles querem-se longe da miscigenação, dos pobres, dos de cor, daquelas religiões esquisitas, daquelas culturas excêntricas e não se querem misturar com deficientes ou com quem tem mais dificuldades de aprendizagem, eles querem a sua caixa, viver na sua bolha, como se o mundo fosse a “merda” da sua bolha…
É verdade que muitas crianças, mesmo sendo assim educadas, depois mudam. E ainda bem. Mas grande parte não e os seus pais nunca despem nem despirão o “amarelo”.
O amarelo da ignorância, o amarelo do egoísmo, o amarelo da abstracção…