Normalmente os políticos, quando uma pergunta não lhes convém ou não querem responder, costumam despachar os repórteres com um “Disso agora não falo” e, passo em frente, acrescentam sempre o inevitável “obrigado”.
Este “obrigado” tido como cortesia não o é, pois não demonstra gratidão pela pergunta à qual não responderam, e será, quanto muito, um obrigado por os deixarem em paz e, sendo dispensados de responder, respondem com um “obrigado”!
Mas agora, com Passos Coelho, surgiu uma nova variante, a do “desobrigado”! Mas quem de algo fica desobrigado será sempre porque também a algo estava obrigado. Certo? E o mesmo “meme” perguntado sobre a razão que o levou a mudar de ideias e voltar com a palavra atrás, coisa que afirmou não estar nos seus princípios alguma vez fazer, disse disso ter sido “desobrigado” e, à semelhança do descrito no primeiro parágrafo, também acrescentou o tal “obrigado” da praxe.
Eu não o ouvi, mas os meus botões contaram-me, que um jornalista sagaz e desobrigado lhe terá perguntado: Sr. Dr. Passos Coelho, tendo sido desobrigado de algo a que estava obrigado, dá a impressão que assim ficará para sempre “obrigado” perante quem o desobrigou e, portanto, que lhe fica, no fundo, a dever por essa “desobrigação”? Assim alguma contrapartida, que será? Apoiar a sua candidatura ao prémio Nobel, que ele há muito diz merecer? Não, obrigado, respondeu o Passos Coelho mais uma vez. Mas então, “obrigado”? Volta a perguntar o repórter. Não, não, nem pensar…obrigado. Então esse “obrigado” será uma forma de agradecimento a quem o desobrigou? Voltou à carga o repórter. Agradecimento? Não, obrigado, respondeu Passos e foi à vida…
Sentindo-se “desobrigado” e, portanto, aliviado da obrigação a que se impôs ou a que foi obrigado, nunca se saberá, Passos Coelho ficou mais soft e mandou calar as suas hostes, realmente muito excitadas com as declarações da Mariana Mortágua acerca do propalado imposto sobre o património. Um roubo à classe média, como ousaram até dizer. Essa tal classe que tem activos imóveis superiores a um milhão de euros! Uma tentativa de “sovietização do país”, acrescentou o endiabrado Montenegro. Mas porquê?
Eu alvitro que alguém lhe terá recordado aquele seu discurso de há dois anos e que se tornou viral na Net, como agora se diz, em que ele afirmou:” …Faz ou não faz sentido, perante os valores da Social Democracia, que aqueles que têm valores mais elevados paguem uma sobretaxa adicional…como faz sentido aqueles que tenham activos imobiliários acima de um milhão de euros tenham uma tributação alargada por causa disso…é ou não é um bom princípio social democrata dizer a todos os portugueses que podemos aliviar o esforço de quem pode menos pedindo um contributo adicional àqueles que têm mais? Eu orgulho-me disso…”, rematou ele e o Congresso irrompeu em palmas…
A verdade é que agora diz que aquilo foi quando estávamos sob a troika e que agora é diferente como se, à excepção da sobretaxa adicional, alguma vez o tivesse implementado. Por isso não refere a Mariana Mortágua e diz esperar para ver, que prefere aguardar o orçamento, secundando António Costa e sacudindo a água do capote. Mas sempre com um “obrigado” … apesar de desobrigado.
Mas o seu fiel escudeiro Montenegro, que não deve sentir-se desobrigado, veio afirmar que o discurso da Mortágua era uma tentativa de “sovietização” e, embora os pressupostos sejam os mesmos, o de Passos Coelho, esse sim, é o de um social democrata! Mas porque não terá sido implementado? Por isso mesmo: por ser social democrata e, para eles, neo-liberais, social democracia ser parecido com comunismo! É assim como na América o Obama para os republicanos: um proto comunista!
Montenegro devia desobrigar-se de carregar tão negro nome, e como já não pode ser Monte Branco, pois este já existe, deveria passar a intitular-se “Monte Preto”!
E, já agora, um desobrigado a todos. Obrigado!