O INOPINADO NOBEL A DYLAN…

Eu não ia escrever sobre nada disto e tinha até escrito um texto que disse à minha filha, que por uns dias me veio visitar, mais o Pedrinho e o Paulo, ia publicar, acerca da congruência de um certo comentador que eu me habituei a seguir (mais tarde publicarei), e logo a minha filha se interpôs: Ó Pai…como quem diz “não faças isso” …

…até que não publiquei mesmo, porque surgiu esta inesperada e surpreendente atribuição do Prémio Nobel a Bob Dylan…

Os meus filhos, e não só, para me irritarem, costumam acusar-me de eu ter uma cultura “rasteira”, isto é, que opino sobre tudo, que tenho sempre algo a dizer sobre o que quer que seja, que, de algum modo, sei o mínimo dos mínimos acerca de quase tudo, mas que não sou especialista ou profundo conhecedor de nada!

E tudo isso é verdade, tenho que reconhecer! Como reconheço que deveria ler mais do que leio, deveria ouvir mais do que ouço, deveria conviver mais do que convivo, deveria discutir mais do que discuto, deveria afirmar-me mais do que me afirmo, deveria ser menos “cristalizado” do que sou…tudo isso é verdade, e eu, do alto dos meus 63 anos, reconheço e de tudo isso eu tenho consciência, mas, como disse, apesar de todas essas minhas limitações, não há nada sobre o qual eu não tenha opinião! Eu e muitos como eu…

E é por isso que eu vou escrevendo, vou opinando, vou refletindo, vou até polemizando, dando o que sei e o que penso, e nada mais. No melhor Português que sei e que aprendi, e nada mais…E é isso que, na verdade, confunde alguns, habituados aos tempos dos “especialistas” que, sabendo até ao limite do imaginável de coisas muito particulares, e por mais que saibam dessas coisas, se sentem muitas vezes uns peregrinos quando confrontados com tudo o resto. Há exceções, e honráveis exceções, como a do nosso Amigo Tiago, Ministro da Educação, que não se notam, por exemplo, em Economistas, por mais graduação que tenham, que não aprenderam nem têm qualquer noção das realidades, para além das cartilhas em que aprenderam…Falta-lhes Vida! Aquela vida, que para além de conselheira e avisadora, nos dá aquele “pedigree” que só vivendo caminhando, subindo a escada ou montanha, se aprende…

De modo que as minhas referências são, e serão sempre, a dos “Humanistas”, aqueles que nunca se refugiaram no “misticismo” ou num convento para redimirem os seus males e daí pretenderem mudar o mundo. Desde logo o meu PAI, que tudo me e nos ensinou, a começar por devermos ter que ver sempre no próximo o que ele tem de bom, sendo certo que, consciente disso, tal seria bastante para desvanecer o que de mau em si existisse! Desse legado não me esqueço, nem nos esquecemos. E os “Humanistas” são todos aqueles que, para além do seu “ego”, nos souberam transmitir desígnios universais que conduzam à prosperidade e à igualdade de todos os seus semelhantes. E eu tenho aí muitas referências, para além do meu saudoso Pai…

Acerca desta distinção do Prémio Nobel da Literatura a Bob Dylan, do qual afirmo, desde já, discordar sem qualquer rebuço ou hesitação, eu tive no Facebook um eloquente diálogo com um amigo, que pessoalmente não conheço mas todos sobejamente conhecemos e admiramos, como um dos mais profícuos, talentosos e singulares músicos e criadores de inolvidáveis canções- o JOÂO GIL, dos Trovante, por exemplo- do pós 25 de Abril, e que faz o favor de ser meu Amigo no Face e indivíduo interveniente que eu admiro de forma apaixonante.

Ele defende a atribuição do prémio e eu não! Eu disse-lhe que era um prémio “datado”, porque muito embora eu e ele, e todos os da nossa geração dos 60/70, tivéssemos visto nele um arauto dos novos tempos, das mudanças, com uma linguagem nova e mobilizadora, que até o já batido Pete Seeger surpreendeu, a ponto de lhe dar relevo no primeiro grande festival de música folk de Newport, em 1965, creio, ele ficou datado., preso no tempo. É a minha opinião, que não a dele. E eu perguntei o João Gil o que é que ele fez nas décadas posteriores? Claro que no meio das conversas no Face aparecem opiniões várias, que sendo assim também poderia ser o Carlos Tê, disse o Rui Veloso, ou o João Monge, acrescentou o Gil, porque não o Zeca, o Xico Buarque, o Leonard Cohen, eu sei lá…

Mas o João Gil, perante a minha argumentação, escreveu-me um “post”: “Um dia haveremos de falar”, escreveu ele. O que para mim quer dizer que, apesar da minha cultura “rasteira”, consigo afinal escrever comentários dignos e que obrigam pessoas como João Gil a pensar no que eu disse… Eu agradeci-lhe o facto de se ter dado ao cuidado do contraditório, reiterando a minha ainda maior admiração por ele, que faz parte da minha vida, disse-lhe, não fazendo eu parte da dele…

Mas também lhe disse que, para mim, que a admiração que eu possa ter por qualquer escritor, qualquer músico ou fazedor de arte, seja ela qual for, é tanto maior quanto o seu percurso seja consistente e congruente! E que não é o caso de Robert Zimmerman, o Bob Dylan, nome que adoptou em homenagem ao poeta Dylan Thomas. E nesse caso, disse eu, mereceria mais o prémio o Bruce Springsteen (e não é por estar a ler a sua extraordinária autobiografia-Born to Run), do que Bob Dylan.

“Haveremos de falar disso”, respondeu ele. Haveremos mesmo, disse-lhe eu…

Mas eu não mudo a minha posição e, portanto, quem lembrar ou relembrar aqueles tempos que a nossa geração viveu, apesar da apagada e vil tristeza em que vivíamos, e eu ainda guardo na minha garagem muitos exemplares do “ Mundo da Canção”, uma revista essencial naqueles tempos, que dissecava e analisava todos os discos que saíam e discursava sobre a sua importância no tempo, driblando nem sei como a censura, sabe do que eu estou a falar e da importância que ele e outros tiveram para as nossas consciências e aberturas das nossas mentes aos novos mundos que, inevitavelmente, daí viriam…

Mas Dylan, ao contrário de outros, ficou-se por aí. Por isso eu disse ao Gil que este prémio era um prémio datado. Alguma vez mais se falou de Dylan?

Mas eu disse-lhe mais: que a julgar pelo critério da Academia Sueca, eu daria o prémio ao Bruce Springsteen, ao Bruce sim, um músico e cantor com uma carreira consolidada e coerente, tanto na intervenção social e política como no aperfeiçoamento da sua Arte, um mobilizador e catalisador ao longo de 50 nanos, cinquenta anos sem datas nem hesitações. E parece, aos seus 67 anos, mais pujante do que nunca. E Dylan? Sim, e Dylan?

O JOÃO GIL não concorda, mas eu sei que entendeu. Por isso ele quer, um dia, falar comigo. E eu, juro, tudo farei para falar com ele…

Pese a minha cultura “rasteira” …

 

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