Este é um texto que embora seja aberto a toda a gente é particularmente dirigido à sua Esposa, a Srª D. Amélia Areias, aos seus filhos João Eduardo, Celina, Melinha, Zélia e Francisco José, às suas esposas, seus maridos e filhos e a todos aqueles que durante dezenas e dezenas de anos com ele conviveram e não o podem esquecer. E ao nosso Lugar de GÓIOS, Freguesia de Marinhas e Concelho de Esposende, que nele teve um dos seus expoentes maiores.
Lugar de GÓIOS que, em nome da memória colectiva, em nome do reconhecimento e em nome de todo um passado, um passado que a tantos envolve, desde os nossos Avós, aos nossos Pais, a nós próprios e a toda uma geração, não pode olvidar este enorme Homem a quem toda essa larga geração tanto deve.
Mas também para que fique na memória dos mais novos e dos vindouros que, neste lugar e naquela casa, habitou um Homem BOM, um Homem que despida a capa com que se protegia, de Merceeiro, de Vendeiro e de negociante, para ser um Homem sempre pronto a ajudar tudo e todos, fosse qual fosse a hora do dia ou da noite, o seu pensamento ou a sua religião.
A mim e à minha Família acompanhou-nos sempre durante a nossa meninice, a nossa puberdade e juventude e a ele devemos, numa considerável parte, o que viemos a ser. Mas adiante explicarei.
Mas o quero com isso dizer? É que o Sr. EDUARDO, que tinha uma Mercearia e uma Taberna, era dos únicos que nos finais dos cinquenta e durante os sessenta mesmo, possuía carro e telefone. Pois era ele que durante as noites atendia as pessoas e as levava os doentes ao Dr. Joel Magalhães, ao Hospital e etc… no seu carro e a qualquer hora do dia ou da noite. E era a Srª Amélia que também se levantava para, a qualquer hora do dia ou da noite, dar a injecção que a Bertinha Monteiro também fornecia, a qualquer hora da noite também e sempre dizendo: paga depois!
Gente Grande, Gente de fibra e de um Humanismo sem par! Como esquecer? Como não lembrar e como evitar que tal se apague das memórias? Todos lhe e lhes devemos algo!
E a nossa Família, a Família Vassalo Abreu, ao Sr. EDUARDO MIRANDA, muito deve. O Sr. EDUARDO era grande Amigo dos meus Pais. Eram da mesma idade, mas o nosso Pai, seu grande Amigo, partiu já há quinze anos e nós sabemos o quanto ele sofreu a sua perda. Mas, naquela fase em que o nosso Pai decidiu lutar contra a inevitabilidade de, em vez de pôr os seus filhos a estudar, os pôr, como quase todos, de imediato a trabalhar, ficando logo ali sem qualquer hipótese de evolução no estudo e na cultura, foi o SR. EDUARDO quem o incentivou a isso não fazer!
E disse-lhe: Joaquim, não deixes de o fazer se for pela conta da Mercearia! E assim foi: foram anos e anos em que a nossa Família dependeu da bondade do Sr. EDUARDO, que dizia ao nosso Pai: pagas quando puderes, mas olha que ainda irás ver o teu quintal repleto de grandes carros! Isso dos carros era a metáfora que ele aplicava para dizer que iríamos ser pessoas educadas e de bem com a vida!
E quando o nosso Pai lhe dizia que podia ser como os outros seus colegas que na fronteira de Valença enriqueciam dia a dia, o Sr. EDUARDO sempre lhe disse: Joaquim, tu és feliz é assim! E foram grandes Amigos toda a vida.
Eu, também e particularmente, não me esqueço de uma fase da minha vida em que, por razões circunstanciais, parei de estudar e estive uns meses a aguardar emprego: fui o seu companheiro de escapadas! A Esposende, à Nélia, onde ele ia ter com os seus Amigos e eu com os meus ou à Feira de Barcelos, todas as quintas, onde ele, que lá não ia fazer nada, era como que digamos a sua folga, me levava para, ali por trás do Largo da Porta Nova, lancharmos! Mas, dessa época também não me esqueço do esforço que eu e ele fazíamos para meter no seu carro o Sr. Pires “Gordo”, já velhote e com Parkinson, de uns dois metros de altura por um de largura, pois ele insistia que também queria ir à Nélia! Grande Sr. EDUARDO!O Sr. EDUARDO não sabia dizer Não!
A nossa amizade, feita de reconhecimento, de gratidão, mas também de compromisso com os valores da Vida, manteve-se sempre, tanto com o Sr. EDUARDO e Esposa, como com os Filhos! Eu acho que, fruto da Educação e das memórias, houve sempre e durante todos estes anos como que uma comunhão de sentimentos e de partilha! O SR. EDUARDO foi ao meu casamento e creio que aos de todos os meus Irmãos. Ele era Família!
Visitei-o, juntamente com a minha Irmã, por alturas deste Natal e foi a última vez! Estava débil e a principio não me reconhecia. Mas depois a coisa fluiu e recordamos as nossas estórias! Sei que no ano passado ele foi à Ponte da Barca, à Câmara, visitar o nosso Irmão mais velho, juntamente com o seu genro Martinho, marido da Celina. Para nós o SR. EDUARDO foi sempre o nosso HERÓI!
Se ainda aqui estivesse o Rebaldinho, ele contar-me-ia estórias sem fim, ele que tinha um anormal jeito para se lembrar de tudo…daquelas tardes e noites passadas no Café do Sr. EDUARDO, já cheio de sono mas a aturar-nos, irritando-o no seu Portismo e no seu PPdismo! Mas sempre na galhofa e sempre com a sua condescendência!E sono…
Preencheu uma parte da minha vida e das vidas dos da minha geração mas, para além disso, e muito mais que isso, foi o Homem que lutou pela Saúde das pessoas da terra e era o Homem que lhes transformava o feijão e o milho em azeite, em arroz e em vinho e lhes fiava os complementos essências para as colheitas.
Este HOMEM merecia uma ESTÁTUA em GÓIOS! Naquele lugar que é a nossa sala de visitas, o TERREIRO!
Para que a Memória não se transforme em coisa fútil e o Reconhecimento em coisa estéril.
Descanse em Paz, SR. EDUARDO LOPES MIRANDA.