Há duas coisas simples que já há muito aprendi : A realidade é a que é e não a que eu gostaria que fosse! E que há montanhas de regras das quais discordo mas que tenho que cumprir. Há ainda uma outra e que diz respeito aos resultados eleitorais: Posso não gostar deles mas tenho que os aceitar.
E, partindo destas singelas verdades, torna-se óbvio que a imediata adesão à realidade facilita o entendimento acerca do que deve ser feito. A realidade está aí, sem enredos nem sofismas e, por isso, para definir a próxima governação eu falo de “compromissos” e não de “consensos”. Porquê? Porque enquanto o “consenso” é lato, alargado e impreciso, o “ compromisso” é objectivo e tem pressupostos fixos e imutáveis.
Com os resultados das recentes eleições e tendo em conta a sua finalidade, a eleição de um novo quadro parlamentar e a formação de um novo governo, é competência do PR, ouvidos os partidos com assento parlamentar, convidar o chefe do partido mais votado, ou quem este nomeie, para formar governo. É competência do AR viabilizar esse governo através da aprovação do seu programa e, não o fazendo, cabe a quem o inviabilizou apresentar uma alternativa credível. Uma alternativa que assegure a governabilidade do País, com estabilidade e compromisso.
Mas, tendo em conta esses mesmos resultados eleitorais e a forma como se apresentam e tendo consciência do espaço em que estamos inseridos e de todas as condicionantes que ele implica, tal como as regras dos défices, os tratados que somos obrigados a cumprir e os compromissos que temos que honrar, não resta outra hipótese de assegurar a governabilidade que não seja a coligação que venceu as eleições a formar governo! Isto é para mim claro e o facto do PR ter antecipado o convite não tem qualquer significado relevante. Apenas abreviou os passos. Esse governo será fatalmente em minoria e terá que ter o beneplácito do PS para passar. Primeiro o Programa de Governo e depois o Orçamento de Estado.
E porque razões assim terá que ser? Porque o PS é refém dessas mesmas condicionantes, o ser pró Euro e ter assinado o Tratado Orçamental, entre outras, e também porque, sendo um partido responsável, saberá muito bem que obstaculizar uma solução governativa sem alternativa compatível lhe traria a incompreensão do eleitorado e uma forte penalização futura. E o que deve então fazer? Negociar, fazer algumas exigências por certo, apresentar ideias alternativas e, essencialmente, assumir compromissos mútuos com o governo em áreas relevantes e até estruturantes como sejam a reforma da Segurança Social, a reforma do Estado, a sustentabilidade do Estado Social etc. etc.
A outra hipótese, a hipótese de fazer um governo maioritário à esquerda, apesar de ser aritmeticamente possível, não se mostra sustentável porque esbarraria, tal como o governo do Syrisa na Grécia, com a intransigência do CE em aspectos fulcrais com os quais os seus parceiros à esquerda nunca se comprometeriam e não vale a pena fingir que essas exigências não existem porque existem e são reais. E se assim fosse e tivessem que ser convocadas novas eleições era certo e seguro que a aventura teria um pesado preço eleitoral.
Eu não vejo outra hipótese que não a de, através de compromissos, esta coligação formar governo e ela é também necessária para um apaziguamento da sociedade, para um refrear da crispação e como vislumbre de algumas pontes que possam possibilitar a ultrapassagem em tempo tão breve quanto possível dos constrangimentos que nos afligem.
Daí que eu pense que contrariando alguma ortodoxia que o anterior governo demonstrou, o Povo Português ao votar como votou deixou uma mensagem de grande responsabilidade aos partidos: não quer ortodoxias, quer entendimento, quer previsibilidade e quer segurança e rumo certo. E diria mais : quer transparência e envolvimento. Está em causa o futuro de todos e exige-se mais diálogo construtivo, mais sensibilidade social, mais justiça e, certamente, mais responsabilidade.
Esta é a leitura que eu faço e que penso ser de linear evidência. António Costa, que tem fama de ser pessoa de diálogo e de compromissos, tem aqui uma relevante missão, salvaguardando as traves mestras do seu programa sim, mas tendo sempre o interesse do País como desiderato.
Pedir o impossível só em sonhos! Na vida real só se pode ter o que se pode!